O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, anunciou um pacote fiscal de R$ 70 bilhões, com medidas que prometem mexer na estrutura econômica do Brasil. O pronunciamento, transmitido em rede nacional no último dia 27, trouxe promessas de mudanças no Imposto de Renda, ajustes em benefícios sociais e reformas no sistema previdenciário militar. No entanto, especialistas questionam os reais impactos dessas medidas, alertando para consequências que podem pesar no bolso dos contribuintes e agravar desigualdades.
As medidas propostas
Entre os principais pontos do pacote estão a isenção do Imposto de Renda (IR) para quem ganha até R$ 5 mil mensais e a criação de uma alíquota de 10% para rendas acima de R$ 50 mil. Além disso, o governo propõe mudanças significativas na previdência dos militares, incluindo a instituição de idade mínima para aposentadoria e restrições à transferência de pensões. Outra medida anunciada é a vinculação das emendas parlamentares ao Produto Interno Bruto (PIB), buscando reduzir o déficit fiscal e promover uma distribuição mais equitativa de recursos.
O ministro destacou a necessidade de ajustar contas públicas e impulsionar a economia, mas tributaristas alertam para desafios de implementação. “O cenário econômico atual está longe do otimismo demonstrado pelo governo. O pacote é ambicioso, mas falta clareza sobre sua aplicação prática”, afirma Alessandro Batista, tributarista e sócio do ABN Advogados.
Impactos para os contribuintes
Uma das principais preocupações levantadas pelos especialistas é o efeito redistributivo das mudanças tributárias. Segundo Renata Elaine Ricetti Marques, advogada pós-doutora em Direito Tributário pela USP, a isenção de IR para rendas de até R$ 5 mil pode ter consequências econômicas complexas. “Embora pareça benéfica à primeira vista, essa isenção pode gerar desequilíbrios. O impacto na arrecadação será significativo, e o governo pode ter dificuldade em compensá-lo apenas com a taxação de rendas mais altas”, explica.
Ela também alerta que, se a arrecadação esperada com a nova alíquota não se concretizar, haverá pressão sobre o custo de vida. “Essa medida pode levar a um aumento de preços, o que acaba impactando negativamente a população que deveria ser beneficiada”, conclui.
Benefícios sociais e ajustes militares
Outro aspecto controverso é a revisão no sistema de benefícios sociais. Embora o governo tenha destacado a intenção de combater fraudes, tributaristas apontam que os cortes recentes têm afetado populações vulneráveis. “Há uma narrativa de eficiência administrativa, mas sem políticas para reinserção no mercado de trabalho, essas pessoas permanecem em situação de extrema vulnerabilidade”, ressalta Batista.
Por outro lado, João Valença, tributarista do VLV Advogados, considera positiva a proposta de reforma previdenciária para os militares. “A discussão sobre ajustes na previdência militar está em pauta desde 2019. É um passo necessário, mas ainda insuficiente, pois o corte fiscal continua a recair majoritariamente sobre o setor privado”, avalia.
Congresso Nacional e o papel do Legislativo
Uma das medidas mais polêmicas do pacote é a limitação das emendas parlamentares, vinculando-as ao PIB. O governo argumenta que a mudança trará maior controle sobre o orçamento, mas especialistas veem um impacto direto na autonomia do Congresso. “As emendas parlamentares, apesar de criticadas, garantiram maior independência ao Legislativo em relação ao Executivo. A tentativa de limitar isso pode gerar tensão política e atrasar a implementação das medidas fiscais”, comenta Batista.
Além disso, a falta de regulamentação detalhada das propostas aumenta a incerteza sobre a viabilidade do pacote. “O anúncio parece mais uma promessa do que uma realidade concreta. Será necessária uma ampla negociação com o Congresso para viabilizar essas mudanças”, analisa Valença.
Cautela e desafios à frente
Embora o pacote fiscal represente uma tentativa de reorganizar as finanças públicas, especialistas destacam que ele traz riscos tanto para a economia quanto para a sociedade. “O governo precisará balancear arrecadação e equidade social para que o impacto das medidas não acentue desigualdades já existentes”, alerta Ricetti Marques.
Com um cenário econômico desafiador, o pacote fiscal de Haddad é um divisor de águas que dependerá de articulação política e ajustes estratégicos para evitar que suas promessas se tornem mais um peso sobre os ombros do contribuinte.